I. Que deveres e responsabilidades têm os órgãos de administração no contexto do COVID-19?
- Nos termos da legislação societária, sobre os membros dos órgãos de administração das sociedades incidem especiais deveres de cuidado, os quais assumem uma relevância ainda maior quando estamos perante uma situação de pandemia como aquela que o país (e o mundo) atravessa.
- Os deveres de cuidado que sobre os órgãos de administração das sociedades incidem, refletem-se não só nas relações da sociedade com os titulares do respetivo capital social (sócios ou acionistas), como nas relações com todos os seus trabalhadores e colaboradores, fornecedores e, bem assim, com todos aqueles com quem as sociedades se relacionam no exercício da sua atividade comercial.
- Nesta medida, na concretização do exercício dos deveres que sobre si impendem, aos órgãos de administração das sociedades incumbe fazer uma cuidada análise dos riscos inerentes à ameaça do COVID-19, do possível impacto do mesmo na atividade da sociedade e no cumprimento das obrigações assumidas e, bem assim, analisar a melhor forma de proteger todos aqueles com quem a sociedade se relaciona.
- Assim, sob pena de responsabilização, aos órgãos de administração das sociedades incumbe, designadamente, elaborar e implementar, com diligência, planos de contingência, os quais, orientados por critérios de racionalidade e ponderação, devem ser atempadamente comunicados a todas as estruturas da sociedade e, bem assim, encontrar-se de acordo com as instruções das autoridades de saúde, devendo ser revistos sempre que necessário.
- Em caso de impossibilidade, atual ou eventual, de a sociedade cumprir, total ou parcialmente, as obrigações assumidas, sobre os membros dos órgãos de administração incide o dever de informar, logo que possível, os parceiros negociais que serão afetados por tal facto.
- Se, atendendo à evolução do COVID-19 e ao seu impacto na atividade da sociedade, for expectável que esta se veja impossibilitada de cumprir as obrigações por si assumidas, incumbe, ainda, aos órgãos de administração, analisando o caso em concreto, verificar sobre a existência de fundamentos que permitam que a sociedade proceda à resolução, justificação de mora ou incumprimento definitivo dos contratos cujo cumprimento se prevê que seja afetado, designadamente com recurso ao mecanismo da alteração das circunstâncias ou verificação dos pressupostos de que depende a aplicação de eventuais cláusulas de força maior.
II. Como devem decorrer as Assembleias Gerais e as reuniões dos demais órgãos no contexto do COVID-19?
Das Assembleias Gerais Anuais
- A situação epidemiológica que atravessamos surge em pleno período de realização das assembleias gerais anuais de aprovação de contas das sociedades.
- A realização de assembleias gerais presenciais, nas quais, no mesmo espaço físico, se encontram presentes os sócios ou acionistas das sociedades (ou quem represente os mesmos), podendo ainda estar presentes, designadamente, os membros dos órgãos de administração e os membros dos órgãos de fiscalização, acarreta um risco para a saúde de todos os intervenientes, indo contra as instruções das autoridades de saúde que aconselham o menor contacto presencial possível.
- Nessa medida, o Decreto-Lei n.º 10-A(2020, de 13 de março prorrogou, até ao dia 30 de junho de 2020, o prazo para a realização das assembleias gerais das sociedades comerciais, das associações ou das cooperativas que, por imposição legal ou estatutária.
Das demais Assembleias Gerais
- Não se encontrando a realização de assembleias gerais proibida, é essencial que, a terem lugar, as sociedades comerciais adaptem a realização das mesmas à atual situação de pandemia.
- Nessa medida e uma vez que o enquadramento legal em vigor permite a realização de assembleias gerais não presenciais, sempre que os estatutos da sociedade não o proíbam, as assembleias gerais devem ser realizadas com recursos a meios telemáticos, devendo a sociedade assegurar a autenticidade das declarações e a segurança das comunicações, procedendo ao registo do seu conteúdo e dos respetivos intervenientes.
- Ainda que, nos termos legais, a convocatória para a assembleia geral deva referir a possibilidade de participação na mesma por meio telemático, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, o Instituto Português de Corporate Governance e a Associação de Empresas Emitentes de Valores Cotados em Mercado, num conjunto de recomendação emitidas recentemente consideraram que, atendendo à situação excecional que atravessamos, mesmo que o aviso convocatório seja omisso quanto a tal possibilidade, ainda assim não deverá ser afastada a possibilidade de recurso aos meios telemáticos se o mesmo for dado a conhecer até ao momento da realização da assembleia pelos mesmos meios utilizados para a divulgação do aviso convocatório.
- Também com vista a minimizar os riscos para as pessoas envolvidas, desde que os estatutos da sociedade não o proíbam, dever-se-á, sempre que possível, recorrer ao voto por correspondência, devendo aquele instrumento regular o seu exercício, garantindo a sua autenticidade e confidencialidade.
- Em alternativa à realização das assembleias gerais, poderá recorrer-se, de igual modo, à tomada de deliberações através de deliberações sociais unânimes.
- Caso a assembleia geral tenha impreterivelmente de ser realizada presencialmente, não sendo possível o seu adiamento, os respetivos intervenientes deverão dar cumprimento às instruções das autoridades de saúde no que respeita às regras de segurança e de higiene a adotar.
- Independentemente de a assembleia geral se realizar com recursos a meios telemáticos ou presencialmente, a disponibilização aos participantes da informação prévia à assembleia geral deverá ocorrer com recursos a meios eletrónicos, sendo disponibilizada no sítio de internet da sociedade e, quando aplicável, no Sistema de Difusão de Informação da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, evitando, assim, deslocações à sede da sociedade para efeito de consulta da mesma.
Das reuniões dos demais órgãos
- As recomendações aplicáveis à realização das assembleias gerais são extensíveis às reuniões dos demais órgãos sociais das sociedades comerciais.
Manuel Ferreira da Costa
Sócio
Maria Luísa Lobo
Advogada Associada do Departamento de Comercial, Societário e M&A
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